quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016





Última oportunidade

Evandro Noleto Bezerra
enoletob@gmail.com
O mundo ocidental ainda se acha sob o impacto doloroso da chacina de Paris, perpetrada pelos jihadistas do grupo terrorista Estado Islâmico na noite de 13 de novembro do ano passado.
No recinto da casa de shows Bataclan, frequentada em sua maioria pela juventude local e pelos estrangeiros que acorrem à Cidade Luz, desenrolou-se uma das cenas mais deploráveis e inauditas dos tempos modernos, verdadeira carnificina que resultou na morte de mais de uma centena de pessoas e feriu gravemente mais de 200 espectadores, afora outros assassinatos em pontos diversos e não muito distantes do primeiro, levando terror à capital francesa e obrigando as forças de segurança a decretarem o estado de exceção, com a consequente limitação das liberdades individuais.
Mais de quatorze anos atrás, outro grupo terrorista, muçulmano como o anterior, ceifou a vida de quase três milhares de pessoas, numa série de atentados aéreos que tiveram por alvo as cidades norte-americanas de Washington e Nova Iorque,causando justa indignação e servindo, infelizmente, de pretexto para a guerra dos EUA contra o Iraque.
Inúmeros outros atentados, de maior ou menor monta e não menos deploráveis, se sucedem quase diariamente, sobretudo na África e em países do Oriente Médio, os quais, por não despertarem o interesse da mídia ocidental especializada, continuam quase ignorados pelos povos das nações que se dizem desenvolvidas.
Estes e outros fatos apocalípticos, que se vêm sucedendo desde a década de 70 do século passado e alcançam proporções inimagináveis em nossos dias, parecem desmentir a alvorada de uma Nova Era, revelada pela Espiritualidade superior, qual seja a da transformação do nosso mundo, hoje de provas e expiações, onde o mal predomina, em mundo de regeneração, em que o homem, embora ainda tenha provas a sofrer, já não experimenta as pungentes angústias da expiação. Parecem, dissemos nós, porque o bem não faz propaganda de suas realizações, o anonimato das boas ações é sufocado pelo ruído ensurdecedor da prepotência dos maus, a imprensa pouco ou nada ganha com isso, preferindo dar destaque aos escândalos de que se nutrem os aborrecidos da luz.
E dizer que tudo isto tem sido feito em nome de Deus, cuja doutrina, ensinada e vivenciada pelo Cristo, só prega o amor, a tolerância, o perdão, o entendimento, a benevolência incondicional aos semelhantes…
A intolerância religiosa não é monopólio desta ou daquela facção que pregam o Reino dos Céus. Num passado não tão remoto, algumas correntes do Cristianismo perpetraram atrocidades não menos graves do que as presenciadas atualmente, sobretudo na Europa e particularmente na Espanha, sob o pretexto de converter os hereges e estabelecer o seu domínio material, não só entre os plebeus, mas visando também a nobreza, estribados no argumento falacioso de que representavam a Divindade, na Terra. Quantas criaturas foram lançadas nos calabouços sombrios das prisões medievais, torturadas e queimadas vivas nas fogueiras da Inquisição, sem qualquer piedade, simplesmente por não comungarem das ideias que lhes eram impostas pela ortodoxia religiosa da época?
Os atentados terroristas dos nossos dias estão sendo atribuídos, em sua maioria, a correntes radicais do Islamismo, pretensamente estribadas na doutrina de Maomé, o profeta que veneram e por cujas ideias dizem lutar. Aliás, sobre o profeta do islã correm as versões mais desencontradas, mentirosas umas, apaixonadas outras, num misto de ficção e meias verdades, por lhes faltar a imparcialidade que as legitimaria. Segundo Allan Kardec:
Deve-se julgar Maomé pela história autêntica e imparcial, e não conforme as lendas ridículas que a ignorância e o fanatismo espalharam por sua conta ou as descrições feitas pelos que tinham interesse em desacreditá-lo, apresentando-o como um ambicioso sanguinário e cruel. Também não se deve responsabilizá-lo pelos excessos de seus sucessores, que quiseram conquistar o mundo para a fé muçulmana de espada em punho. Sem dúvida houve grandes infâmias no último período de  sua vida; ele pode ser censurado por ter abusado, em algumas circunstâncias, do direito de vencedor e de nem sempre ter agido com a moderação necessária. Entretanto, ao lado de alguns atos que a nossa civilização reprova, é preciso  dizer, em sua defesa, que muitíssimas vezes ele se mostrou muito mais humano e clemente para com os inimigos do que vingativo e que inúmeras vezes deu provas de verdadeira grandeza de alma.
Deve-se reconhecer, também, que mesmo em meio aos seus sucessos e quando havia chegado ao ponto culminante de sua glória, ele se fechou, até o seu último dia, no seu papel de profeta, sem jamais usurpar uma autoridade temporal despótica.
Não se fez rei, nem potentado e jamais, em sua vida privada, se manchou por um ato de fria barbárie ou de baixa cupidez. Sempre viveu simplesmente, sem fausto e sem luxo, mostrando-se bom e benevolente para com todos. Isto é da  História.1
Nos dias atuais presenciamos verdadeira turba de Espíritos fortemente inspirados pelas Trevas, encarnados entre nós para darem vazão aos instintos bestiais de que ainda não se libertaram, dentre os quais a total ausência de compaixão e de misericórdia, agindo no planeta quais justiceiros impenitentes e enraivecidos, à semelhança das entidades infelizes descritas nas obras de André Luiz.
Até quando agirão com tamanha desenvoltura? Por que o Senhor não lhes tolhe as ações criminosas? É o que nos perguntamos muitas vezes. Certamente não é absoluto o nosso livre-arbítrio. Chega um dia em que a Providência divina diz ao recalcitrante: – Não irás mais longe! Enquanto o momento não chega, nós, os pretensos “inocentes”, somos chicoteados pelo azorrague da impiedade, pagando, muitas vezes, com a vida e de forma enviesada, o que fizemos sofrer os outros, no passado. Não se infira daí que os criminosos estão justificados perante a Lei, pela razão pura e simples de que Deus, o Pai celestial, não se serve de mãos assassinas para que se cumpra a sua Justiça.
E como age o Senhor quando um de seus filhos, pela persistência no erro e na iniquidade contumazes, destoando por completo dos demais habitantes do planeta, transforma-se em verdadeiro estorvo a ponto de dificultar ou retardar a ascensão  da Terra a mundo de regeneração? Allan Kardec esclarece que:
Logo que um mundo tem chegado a um de seus períodos de transformação, a fim de ascender na hierarquia dos mundos, operam-se mutações na sua população encarnada e desencarnada.
É quando se dão as grandes emigrações e imigrações […]. Os que, apesar da sua inteligência e do seu saber, perseveraram no mal, em sua revolta contra Deus e contra suas leis, se tornariam daí em diante um embaraço ao ulterior progresso moral, uma causa permanente de perturbação para a tranquilidade e a felicidade dos bons, pelo que são excluídos da humanidade a que até então pertenceram e enviados a mundos menos adiantados, onde aplicarão a inteligência e a intuição dos conhecimentos que adquiriram ao progresso daqueles entre os quais são chamados a viver, expiando, ao mesmo tempo, por uma série de existências penosas e por meio de árduo trabalho, suas faltas passadas e seu voluntário endurecimento.2
E assim a Terra progride. Mas não basta expurgar os maus, é preciso que cheguem os bons para tomar-lhes o lugar. É ainda Allan Kardec que projeta luz sobre o assunto:
Ao mesmo tempo em que os maus se afastam do mundo em que habitavam, Espíritos melhores aí os substituem, vindos quer da erraticidade, concernente a esse mesmo mundo, quer de um mundo menos adiantado, que mereceram abandonar, Espíritos esses para os quais a nova habitação é uma recompensa. Desse modo, a população espiritual, renovada e expurgada dos seus piores elementos, fará com que melhore, ao cabo de algum tempo, o estado moral daquele mundo.2
Tudo indica que nossos irmãos extremistas do Oriente, que tentam se acobertar e justificar seus desmandos sob o véu do Islamismo desfigurado, estão tendo a última oportunidade de reencarnar em nosso planeta, para a ele retornar, não se sabe quando, somente depois de redimidos dos erros que os expulsaram da Terra, então transformada no “paraíso perdido” de que outrora nos falava a alegoria bíblica.
Diante de fatos tão lamentáveis, como é grandiosa a mensagem do Evangelho de Jesus! Em suas exortações, o Mestre jamais pregou a conquista do Reino dos Céus pela violência, recomendando sempre a persuasão e a doçura em todas as situações. Porventura terá dito, alguma vez, aos seus discípulos: “Ide, matai, massacrai, queimai os que não crerem como vós? Não; o que, ao contrário, lhes disse foi:
[…] “Todos os homens são irmãos e Deus é soberanamente misericordioso; amai os vossos inimigos, fazei o bem aos que vos [odeiam]; orai pelos que vos perseguem e caluniam. […] “Quem matar com a espada perecerá pela espada”.3
No dia em que os homens compreenderem que Deus, Alá e Jeová representam o mesmo Ser – “a inteligência suprema, causa primeira de todas as coisas” –,4 dar-se-ão as mãos e confraternizarão em paz, tornando-se cada vez mais longínquas as disputas e guerras religiosas, que, a esse tempo, não passarão de vaga lembrança, de fumaça evanescente a dissipar-se nos corações e mentes da humanidade regenerada.
REFERÊNCIAS:
1 KARDEC, Allan. Revista espírita: jornal de estudos psicológicos. Trad. Evandro Noleto Bezerra. ano 9, n. 11, nov. 1866. 2. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2009. cap. Maomé e o Islamismo, p. 430-431.
2 ____. A gênese. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 1. imp. Brasília: FEB, 2013. cap. 11, it. 43 e 44, respectivamente.
3 ____. O evangelho segundo o espiritismo. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed.
3. imp. Brasília: FEB, 2015. cap. 23, it. 15.
4 ____. O livro dos espíritos. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 4. ed. 2. imp.Brasília: FEB, 2014. q. 1.

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